(colaboração de Cláudia Rodrigues)
A foto de um menino de 8 anos, dentro da água, fascinado com a queima de fogos no Réveillon da Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, autoria do fotógrafo Lucas Landau, stringer da agência Reuters, transformou-se em fenômeno de viralização nas redes sociais nas primeiras horas de 2018 (foto do alto). A imagem, focalizada em milhares de postagens e comentada em matérias nacionais, internacionais e artigos, foi publicada originalmente por Landau, em seu Instagram – com novo recorte e sem cores – e fez seu número de seguidores multiplicar de 7 mil para 30 mil em três dias.
Curiosamente, não foi a foto escolhida pela Reuters para ilustrar o evento que atrai a atenção do mundo para o Ano Novo em Copacabana. Enquanto a agência optou por uma imagem que mostrava o reflexo da explosão de fogos de artifício no mar e um grupo de pessoas no contraluz – eleita a melhor foto do mês de janeiro – o registro postado por Landau no Instagram capturou as redes a partir de polêmicas sobre sensacionalismo, uso indevido de imagem, racismo e estereótipos a respeito do negro. A superexposição e acusações públicas nas redes sociais, impostas a Lucas Landau, despertam não só a atenção sobre o profissional mas, especialmente, sobre as rotinas de produção da Reuters na cobertura do Ano Novo.
Autodidata e neto de polonês, Lucas Landau fotografa desde os 14 anos. Com passagem pelas revistas Rolling Stone Brasil, Vogue e Harper’s Bazaar, voltou suas lentes para o fotojornalismo aos 23 anos, quando iniciou sua carreira na Reuters. Cobriu as jornadas de junho em 2013 – manifestações que se espalharam pelas cidades brasileiras e tiveram, como estopim, protestos contra o aumento das passagens de ônibus. A Copa de 2014, a Olimpíada de 2016 e, mais recentemente, fotos documentais que abordam questões sociais e ambientais também fazem parte do portfolio de Landau.
No dia 11 de janeiro, uma reportagem do El País Brasil revelou que o menino é morador de favela e estava com a mãe – vendedora ambulante. Até ali, não faltaram especulações, inclusive sobre as possíveis motivações do fotográfo. Falando ao Blog Agências de Notícias, Landau revela o protocolo de seu trabalho: dezessete minutos para cobrir o réveillon e a decisão de enquadrar a queima de fogos dentro do mar, registrando a diversidade de tipos: brancos, negros, um casal de namorados, um grupo de amigos, turistas e crianças. O menino foi um dos personagens que Landau percebeu no meio da multidão – o único com quem fez um rápido contato.

“Sinto, na rua, que temos a perspectiva que a mídia local não tem. Sei o que posso e o que não posso. Conheço a linguagem fotográfica da Reuters”, sintetiza, acrescentando: “Meu trabalho é registrar como um perito criminal. Não julgo o crime, eu levo as provas”.
O registro fidedigno é uma das exigências da Reuters, que não aceita nenhum tratamento nas fotos enviadas pelos fotógrafos. Ao receber a foto original da queima de fogos com o mar avermelhado, a mesa de Singapura – que fazia a seleção do material e a distribuição – desconfiou da utilização de filtro e imediatamente ligou para checar e pedir o “original”, recorda-se Landau. Há dois anos, a agência proibiu fotos no formato RAW – imagem cru com alta flexibilidade de tratamento – e determinou envio de material em JPEG com o mínimo de processamento (corte, correção de níveis, etc.). Segundo Landau, as fotos não devem receber nenhum tipo de edição ou distorção.

“É muita responsabilidade fotografar para a Reuters. Nosso trabalho envolve critério e ética. Documentar o mundo não é fazer um juízo de valores. Mas a realidade é subjetiva e as interpretações fogem ao controle do autor. A foto do menino ganhou vida própria. Virou símbolo do preconceito no país”, pondera Landau.
Embora Landau perceba diferenças nas abordagens da Reuters e da imprensa local, a agência anglo-canadense tem buscado absorver profissionais nascidos ou integrados à região com um olhar local mais aguçado e sensível sobre os acontecimentos, como revelou a pesquisadora Maria Cleidejane Esperidião em sua pesquisa sobre a instituição. Essa política, assinala Jonathan Fenby – ex-editor da Reuters, pesquisador e autor do livro The International News Services (1986) – visa evitar os estereótipos da apuração reprocessada a partir de um garimpo terceirizado junto à mídia local que facilmente incorre em simplificações. O episódio que envolveu Lucas Landau evidenciou o quanto a estratégia é complexa.
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